quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Viagem no tempo


Quando eu era garoto, comecei a fazer serviço de banco pros meus pais. Não era essa facilidade de hoje em dia, que podemos acessar o banco com um aplicativo de celular e fazer até depósitos em cheque tirando uma foto.
Pra ir até a agência também não era a moleza que é agora, com um banco aqui na esquina. Em relação à distância, por exemplo, eu tinha que pegar um ônibus na ida e outro pra voltar. E tinha que pagar as duas passagens, em dinheiro ou passe de papel. Nada dessas modernidades do bilhete único.
Na agência, também não tinha moleza. Tinha que preencher guia de depósito, para sacar tinha que ser com cheque. Mas aceitava todas as contas, exceto boleto vencido de outro banco.
A movimentação da conta tinha que ser com talão de cheques ou, no caso de poupança, a caderneta.
E por falar nela, só podia depositar naquele dia e os juros eram trimestrais. Se fosse aplicar em outro dia, era obrigado a abrir outra conta, uma pra cada dia do mês, exceto a partir do dia 29. Por causa de fevereiro, é claro. Tem uma história sobre um imperador romano ter roubado um dia do mês de fevereiro, mas isso é pra outro dia.
As filas eram imensas, mas tinha caixa de monte. E o pessoal passava o tempo conversando ou lendo. Não tinha Facebook nem WhatsApp, muito menos celular. Computador era coisa de seriado de ficção científica (assim eu imaginava na época). Em vez disso, tinha máquinas de escrever e registradoras que autenticavam os recibos.
“E música, as pessoas ouviam?”, perguntou a criança.
Pensei um pouco antes de responder. “Sim, os clientes começaram a ouvir música dentro do banco quando apareceu o walkman.”
“O que é um walkman?”
“É...” eu titubeei. “É o aparelho que a gente usava pra ouvir música fora de casa na época.”
“E usava esse tal walkman pra mais alguma coisa?”
“Bem, alguns modelos dava até pra gravar.”
“Só??”
“Quer que eu continue ou você quer mudar de assunto?”. Ele olhou pra mim, em dúvida. Depois fez um sinal pra continuar a história.
Caixa eletrônico? Nem sonhávamos com isso (os clientes, claro). E lotérica era só pra aquilo: fazer aquela fezinha na loteria federal ou na esportiva.
Não tinha porta giratória também, travando com qualquer vintém. Mas o risco de assaltos era mais alto, justamente por isso.
As filas eram por caixa, e o pessoal ficava mudando de fila quando percebia que uma andava mais rápido, igual ao que os motoristas fazem no trânsito. Até que um dia inventaram de fazer a fila única.
Só que era única mesmo. Ficava idoso, gente com criança, grávidas, na ordem de chegada. Acho que isso começou a mudar quando fizeram a lei do transporte gratuito pra idosos, depois os assentos preferenciais. Aí apareceu a fila preferencial.
Vieram então as portas giratórias e o pessoal dando piti porque a porta travava, e culpavam os seguranças de não irem com a cara do cliente e travar a porta.
Um dia, apareceu uma máquina num canto da agência e pediram pro meu pai criar uma senha. Eu nunca tinha ouvido aquela palavra, mas o gerente disse que, com os dados da conta e a senha, meus pais poderiam tirar um saldo ou extrato da conta sempre que quisessem. Bom, como eu ia ao banco todo dia, acabei decorando a tal da senha (e o número da agência e da conta) e tirava um extrato sempre que fazia um depósito.
Depois vieram com um retângulo com o nome do banco, agência, conta e o nome da pessoa. Na época, a gente nem sabia o que era cartão de crédito. E o caixa eletrônico.
No começo, ele fazia o mesmo que aquelas máquinas onde a gente tirava extratos – que basicamente era uma calculadora de mesa com bobina, só que em vez de cálculos dava a movimentação da conta ou o saldo.
Mas, voltando ao caixa eletrônico, ele fazia três coisas: extrato, saldo e sacar dinheiro. E tinha que usar o tal do cartão com a senha. E ela era só de números. Hoje tem tantas opções que a gente fica tonto só de olhar. Depois veio a internet e agora os aplicativos de celular.
“Puxa, pai, como você sabe tanto sobre banco?”
“Ora, filho! Eu trabalho em um. Só que as coisas mudaram muito desde a época em que eu era criança.”

“Puxa, como você é velho!” disse o garoto. “Isso aconteceu mesmo ou você inventou tudo isso?”

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